AdriCaramelo

Sob o visco de Apiúna

Foi uma mudança muito drástrica. O calor intenso que eu amava virou inferno, e quando eu achei que o frio pudesse se tornar o céu eu conheci Apiúna. Eu ainda não sei que árvore era aquela, se era um visco por estar perto do Natal, ou se era uma árvore maior com flores amarelas que enxeram meus cabelos de folhas secas, mas quando eu acordei eu sacodi a minha cabeça para afástá-las e de repente eu estava feliz. Não é exatamente o céu, mas é bem melhor do que estar sozinha.

A janela do quarto


Não sinto tua falta. Não sinto falta do teu cheiro, de quem acabou de sair do banho para me dar um abraço de leve. Não sinto falta dos teus sóis na cara, dois sóis amarelos. Nem do teu sorriso fácil que desvia o olhar do meu. Teu sorriso? Não sinto falta. Sinto ânsia, distância. Da fumaça da noite. Da jaqueta emprestada. Da janela do quarto.


Imaginação


Se você não disser e eu supor.
Se eu ouvir da tua boca velada
Diz só sobre mim?
Ou diz sobre nós?
Eu seguro entre as pernas
Todas as palavras que vem
E sobem pelo corpo
E param no topo da cabeça
E saem pela boca.
Distorcidas.

Tudo o que começa entre as pernas, passa pelo estômago e finaliza na mente sai de forma concreta. Mas o que eu suponho não é concreto. O que eu suponho não passa pela tua boca velada.
Tenho vontade de chorar, porque o abstrato é límpido e leve, mas vive lá na outra realidade, sem planos, sem passado, sem pretensão. Tenho vontade de chorar porque é bonito. É bonita a luz que passa sempre pelos olhos amarelos, e é bonito o desejo de permanecer podendo ir. É bonita a leveza, é bonita a esperteza e é bonito o caos. Mas tudo isso é concreto, existe agora. O caos é concreto e eu me esquivo, eu fujo. E quando eu fujo eu suponho. E sonho.

Despertar


À noite eu deito no colchão e antes de pegar no sono eu sinto a relva crescendo embaixo de mim. No solo úmido crescem plantas e pequenas flores brancas como plumas que se desfazem com o vento e dançam lentamente sobre mim. Percebo uma gota de orvalho sustentada por um milímetro. Ela vai cair. Quanto tempo dura esse instante? Quanto tempo tem um instante? Um milésimo de segundo ou uma vida inteira? Enquanto ele dura eu respiro e minha boca forma uma lua minguante. Vejo meu reflexo na gota. Convexo e ao contrário, como se o lado de lá fosse o mundo real. Eu me espio, o instante dura e eu adormeço. Ou acordo.